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Criação de mundos virtuais nos faz refletir sobre imaginação e realidades

Realidade virtual parecia coisa de cinema de ficção. Mas ela já está entre nós, inclusive nas salas de aula das Humanidades.


Por Guilherme Falcão*


Imagem baseada na arte de Mohamed Hassan, disponível gratuitamente no Pixabay

A nossa relação com a tecnologia é tão cotidiana quanto fundamental. Já faz um tempo que o ato de refletir sobre a imersão em mundos virtuais deixou de ser casuais exercícios de futurologia ou ficção e se tornou, enfim, algo prático, fomentando questionamentos basilares para o seguimento de nossas vidas.


Mais especificamente, pensando num caso mais próximo às preocupações do ImageH, podemos refletir sobre essas tecnologias a partir de seus potenciais didáticos, isto é, de como o uso dessas ferramentas pode auxiliar os docentes de sociologia a desenvolver práticas educativas colaborativas. É importante pensarmos em como os professores e professoras podem exercer o papel de mediadores reflexivos diante da tecnologia, despertando o potencial crítico dos/as estudantes.


Por exemplo, com a massificação de equipamentos como os óculos de Realidade Virtual no mercado e o recente anúncio dos ambiciosos projetos da Meta (como agora é chamada a antiga empresa Facebook), novas chaves de discussão aparecem no horizonte, fazendo imprescindível a reflexão sobre um mundo cujas fronteiras entre o material e o virtual parecem não mais existir.


Mark Zuckerberg no evento de lançamento do Meta, 2021

Há décadas, tecnologias para produção e circulação de imagens integram nosso dia a dia e seguem nos afetando de várias formas; adentram nossos cotidianos e seguem ainda hoje afetando nossas vidas de várias formas. Foi assim com a televisão, com a internet, com os smartphones, com os computadores… esses dispositivos tiveram grandes impactos na transmissão da informação e na representação da realidade e, por isso, se transformaram em ferramentas didáticas úteis.


Nesses meios, a nossa imaginação é projetada com uma fidelidade capaz de construir verdadeiras simulações do nosso mundo. Já nos é bastante comum e cotidiano realizar encontros e reuniões, jogar games em rede, criar personagens e perfis fake ou emitir documentos — enfim, ter uma vida socialmente ativa, porém mediada pelo virtual.


Os alcances desse fenômeno foram artisticamente refletidos por Paulo Bruscky no documentário ficcional As aventuras de Paulo Bruscky, gravado no Second Lifeum jogo virtual com cenários tridimensionais que simula a vida social pela interação entre avatares. Em determinado momento de sua apresentação, que conta com uma narrativa tragicômica, o artista pernambucano afirma que “no Second Life pode se fazer de tudo, né? Os projetos viáveis e inviáveis. Não existem mais projetos inviáveis”. Isso é uma questão importante para que se pense sobre as relações entre os dois mundos, mesmo que, a princípio, pareça óbvia. Segundo Bruscky, cada época tem a sua escrita, por isso é importante que você seja contemporâneo a si próprio.


Confira, na íntegra, o momento em que o avatar do autor se joga de um prédio, mas continua "vivo". Esse seria um dos pontos altos em que os projetos inviáveis passam a existir: a violação da nossa única certeza.

Esse tipo de relação - em que mundos criados por nós (os virtuais) dialogam com e impactam o mundo natural - transformou as fronteiras entre a verdade e a ficção numa grande ilusão de ótica. Pessoalmente, confesso que por vezes me sinto completamente deslocado do que seria plausível para o real quando me pego fazendo uma operação simples, como escanear um QR code para acessar uma informação específica sobre determinado produto.


É inimaginável pensarmos que estamos a pouquíssimos movimentos de distância de absolutamente qualquer parte do planeta. Com algumas poucas ferramentas já acessíveis para uso doméstico — como os óculos de realidade virtual —, consigo me sentir presente até mesmo no fundo do mar, explorando oceanos por horas sem ao menos me preocupar com cilindros de oxigênio ou com minha capacidade pulmonar. É como se, de fato, eu tivesse superado as fronteiras da ficção com a realidade, me tornando um híbrido da minha imaginação com a realidade.


É sobre essa novidade espantosa, empolgante e, por isso, perigosa, que trata esse texto. Estimulado pelo trabalho de conclusão de curso da mestra em sociologia Rosilene Silva defendido no ProfSocio/Fundaj, penso em como podemos usar essas ferramentas e novidades em nosso favor, nos contextos de sala de aula, nos apropriando de suas qualidades didáticas.


Por exemplo, o uso dos óculos de realidade virtual para acessar o Google Earth pode ser bastante útil para "aulas de História, Geografia, Inglês, Matemática e de muitos outros assuntos que utilizam narrativas que se entrelaçam nos conhecimentos do tópico” — como sugere o próprio site da plataforma.


Também para a sociologia, podemos nos deslocar virtualmente e imergir em ambientes relacionados às nossas áreas de interesse. Imagine-se dando uma aula sobre desigualdade social e colocando as estudantes em meio aos problemas urbanos que você deseja demonstrar, como na experiência de adentrar uma favela.

Print do vídeo Além do Mapa, publicado no canal do Youtube do Google Brasil

Esse é um caso que pode ser executado a partir do vídeo Além do Mapa, produzido e publicado no Youtube, no canal Google Brasil. O vídeo de realidade virtual foi gravado com uma câmera que capta imagens em 360º, ou seja, enquanto o vídeo é exibido, podemos navegar e focar em qualquer direção, analisando em minúcia todos os pontos captados pela lente. Temos acesso direto a alguns momentos da vida na favela; a demonstração desse vídeo em sala de aula, por exemplo, pode estimular debates críticos entre as estudantes.


Em tempos de massificação dos óculos de realidade virtual e das buscas de grandes marcas da tecnologia pela popularização e viabilização do metaverso, tudo somado às discussões sobre realidade aumentada, é importante discutirmos as apropriações dessas linguagens para usos didáticos e sermos contemporâneos de nós mesmos.


*Guilherme Falcão é bacharel em Ciências Sociais, bolsista multiHlab/FACEPE e integrante do imageH.

 

Para citar esse texto:


FALCÃO, Guilherme. Criação de mundos virtuais nos faz refletir sobre imaginação e realidades. ImageH, 2021. Disponível em: https://imagehmultihlab.wixsite.com/humanidades.

 

Para saber mais:


Além do Mapa | 360 VR Video | Um dia na favela: https://www.youtube.com/watch?v=wHYHe42VI7A


As Aventuras de Paulo Bruscky: https://www.youtube.com/watch?v=HlI7QrB1Mrs

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