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Humanidades Digitais na escola

Quando pensamos em novos métodos científicos, podemos imaginar também novos métodos de ensino-aprendizagem das Humanidades na escola.


Por Viviane Toraci*



Encontramos um debate intenso no campo educacional relacionado à inserção das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação nos processos de ensino-aprendizagem. As discussões foram ainda mais intensificadas no período de isolamento social exigido pela pandemia de Covid-19, quando as escolas foram fechadas para atividades presenciais e rapidamente foi necessário implementar ações de ensino remoto.


O cenário nos apresenta uma Sociedade em Rede, imersa em seu cotidiano na geração e circulação de dados digitais, filtrados por algoritmos, apresentados por interfaces amigáveis para usuários de telas. É justamente neste ponto que queremos ressaltar a diferença entre ser consumidor de dados e ser produtor de conhecimentos, o que significaria assumir um posicionamento ativo na produção e circulação de conhecimentos como estratégia de disputa do espaço público de forma a participar de e influenciar instâncias de decisão. É o salto que propomos ao pensar que para além da inserção de produtos digitais na educação (entre hardwares, softwares, plataformas e objetos educacionais digitais), precisamos pensar em como inserir as Humanidades Digitais na escola.


Em 18 e 19 de maio de 2010, durante o THATCamp realizado em Paris, foi lançado o Manifesto das Humanidades Digitais, documento que registra o reconhecimento de um campo de conhecimentos novo em franco desenvolvimento. O manifesto é endereçado às comunidades de pesquisa e a quem participa da criação, da edição, da valorização ou da conservação dos conhecimentos. Em seu primeiro item, apresenta as suas definições:


1. A opção da sociedade pelo digital altera e questiona as condições de produção e divulgação dos conhecimentos.


2. Para nós, as digital humanities referem-se ao conjunto das Ciências Humanas e Sociais, às Artes e às Letras. As humanidades digitais não negam o passado, apoiam-se, pelo contrário, no conjunto dos paradigmas, savoir-faire e conhecimentos próprios dessas disciplinas, mobilizando simultaneamente os instrumentos e as perspetivas singulares do mundo digital.


3. As digital humanities designam uma transdisciplina, portadora dos métodos, dos dispositivos e das perspetivas heurísticas ligadas ao digital no domínio das Ciências Humanas e Sociais

O documento reconhece que diferentes comunidades científicas já vinham desenvolvendo práticas, instrumentos e objetos transversais que poderiam convergir para formar o campo das Humanidades Digitais, citando entre eles codificação de fontes textuais; sistemas de informação geográfica; lexicometria; digitalização do patrimônio cultural, científico e técnico; cartografia da web; garimpagem de dados; 3D; arquivos orais; artes e literaturas digitais e hipermidiáticas; entre outros.


Naquele momento, buscava-se o diálogo entre as metodologias de pesquisa das Ciências Humanas e Sociais e as potencialidades advindas com os recursos informáticos digitais em rede, reconhecendo as mútuas influências nas condições de produção e circulação de conhecimentos e propondo a construção de ciber-infra-estruturas evolutivas que respondam a necessidades reais.


Nestes dez anos, foi amplo o movimento de criação, desde métodos para geração de dados digitais (imagens estáticas e em movimento, sons, textos em hipermídia, uso de formulários eletrônicos para coleta de dados); manipulação e análise de dados digitais com formação de diferentes bancos de dados e uso de softwares; até ampla circulação de conhecimentos em formato digital com os bancos de dados abertos, repositórios digitais, bibliotecas virtuais. Captação, geração, manipulação, análise, circulação e retroalimentação de dados digitais nas áreas de interesse científico das Ciências Humanas e Sociais.


A escola acompanha esse movimento, associado principalmente ao uso de métodos e instrumentos digitais para a pesquisa. Ao estimular o uso da pesquisa científica como princípio pedagógico para o ensino de História, Geografia, Filosofia e Ciências Sociais (chamada por “Sociologia” no ensino médio, mas em seu conteúdo, abarca as três áreas, incluindo a Ciência Política e a Antropologia), são apresentados para os alunos instrumentos como formulários eletrônicos, tabulação e configuração de bancos de dados simples em editores de tabelas, uso de plataformas online para geração de nuvens de palavras, acesso a repositórios digitais para busca de dados secundários. Temos, assim, que o impacto nas formas de produção e circulação do conhecimento reverberam também no campo do ensino das Humanidades na escola.


Argumentamos, então, que ao mudar as formas de produzir conhecimentos – agora com uso intensivo de tecnologias digitais – são alterados também como estes conhecimentos são transpostos e reinterpretados por professores e alunos em seu labor educacional. São movimentos que estão acontecendo simultaneamente no ensino superior, onde encontramos os principais atores responsáveis pela pesquisa científica no Brasil; e na educação básica, campo de recontextualização de métodos e conhecimentos científicos. E esse movimento nos interessa. Por isso, vamos abordar neste blog o tema das Humanidades Digitais na escola, abrindo aqui o nosso diálogo.


*Viviane Toraci é pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco, professora do ProfSocio e coordenadora do multiHlab - Laboratório Multisuários em Humanidades.

 

Para citar esse texto:


TORACI, Viviane. Humanidades Digitais na escola. ImageH, 2021. Disponível em: https://imagehmultihlab.wixsite.com/humanidades

 

Para saber mais:


Manifesto das Humanidades Digitais. 2010. Disponível em: <https://tcp.hypotheses.org/497>.


Anais do I Congresso Internacional em Humanidades Digitais. 2018. Disponível em: <https://eventos.fgv.br/hdrio2018/anais-do-evento>.


NASCIMENTO, Leonardo. Sociologia digital : uma breve introdução. Salvador: EDUFBA, 2020.





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