O subtítulo do filme – “é proibido morrer” – é o lema dirigido aos policiais militares durante o funcionamento da UPP da Laje, caracterizando o cenário de extermínio presente nas “pacificações” – tanto por parte daqueles que representam a segurança do Estado quanto pelos jovens supostamente envolvidos no tráfico e os outros moradores do Morro da Laje.
Por Mariana Gomes*
O filme Intervenção: é proibido morrer, do diretor Caio Cobra (2019), é um longa -metragem que trata do debate sobre a guerra às drogas ao retratar a instalação do projeto Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), desenvolvido em 2008 pelo governo do Rio de Janeiro sob a pretensão de instaurar postos policiais comunitários que acabariam com a atuação de facções criminosas nas favelas do estado.
Seu enredo retrata o cenário de violência generalizada a que estão submetidos os moradores das favelas. A militarização e a carência de políticas públicas voltadas às medidas assistenciais, educacionais, de lazer, de arte e de cultura em favelas como a do Morro da Laje, no fim das contas, diminuem as possibilidades de inserção desta população no mercado de trabalho e minam suas expectativas de vida.
O longa termina com a fala de sua personagem principal, Larissa (interpretada pela atriz Bianca Comparato) que, de forma provocativa, menciona que “nota boa não traz prato de comida para ninguém não; mandam a polícia lá pra cima mas não mandam mais coisa nenhuma, está tudo fora do lugar”. “Lá pra cima” é referência ao Morro da Laje, e essa frase, junto ao debate central do longa-metragem, serve de indagação necessária para uma gama de reflexões durante as aulas de Humanidades.
Na história, é possível resgatar uma análise sobre como se deram as formações dos morros e quais as suas relações com as populações que vivem nos lugares mais periféricos.
De acordo com a antropóloga Juliana Borges, em seu livro Encarceramento em massa que trata do debate sobre a política de guerra às drogas no Brasil:
[...] o discurso de amedrontamento da população em relação às substâncias ilícitas cria o caldo necessário para a militarização de territórios periféricos sob o verniz de enfrentamento a esse “problema” social. Sendo assim, o sistema mantém em funcionamento de sua engrenagem pela criminalização, pelo controle e pela vigilância ostensiva desses territórios e por extermínio que se justifica e tem sustentação social de jovens supostamente envolvidos no pequeno tráfico.
Na Sociologia e na Filosofia é possível refletir sobre quais implicações a instauração de UPPs no Brasil trouxe para a vivência da população desses territórios; quais relações com os direitos humanos podem ser discutidas nessa perspectiva; quais políticas públicas podem estar ausentes nesse cenário; qual o papel do Estado no que se entende por segurança pública; qual a pertinência da relação entre cidadania formal e cidadania real nessas situações; além de apontar caminhos possíveis para se discutir sobre como a política de guerra às drogas se relaciona com o financiamento de outros setores da sociedade, mas se fortalece a partir da criminalização, em sua absoluta maioria, de uma população negra. A crítica à guerra às drogas, portanto, visa o caráter punitivo e histórico do encarceramento em massa da população das favelas brasileiras.
Ainda cabe uma observação: o filme possui classificação para 16 anos de idade. Por isso, apesar de conter uma linguagem recheada de palavrões, ele pode ser pauta para um diálogo aberto com os terceiros anos sobre a linguagem em sua construção violenta. No mais, o filme se encontra disponível no YouTube e Netflix.
*Mariana Gomes é estudante de Licenciatura em Ciências Sociais e membro da equipe editorial do imageH.
Para citar esse texto:
GOMES, Mariana. Na sala de aula: Intervenção, é proibido morrer. ImageH, 2022. Disponível em: https://imagehmultihlab.wixsite.com/humanidades
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